A Segurança, ou a falta dela, estava muito em voga lá na Floresta. Sempre tinha sido seguro viver ali. Só para verem, os animais antigamente nem fechavam as portas das tocas e as crias brincavam na rua e iam a pé sozinhas para a escola sem que os pais tivessem medo que fossem atropeladas, que fossem raptadas, violadas, esquartejadas, que apanhassem frio, que pisassem merda de cão... ôôps, espera lá. Isso é um conto infantil, não posso usar essas palavras. Deixem-me só reformular a última frase… Sem que os pais tivessem medo que pisassem merda de algum mamífero canídeo. Pronto, ficou melhor.
O problema é que nos últimos tempos as coisas estavam a ficar agrestes. Ouvia-se cada vez mais falar de assaltos, vandalismos, assédios, drogas, mortes e violência. Não se falava de outra coisa.
A criminalidade tinha aumentado lá na Floresta, é verdade. Mas enquanto a criminalidade subia 20 ou 30%, o sentimento de insegurança subia 80 e 90%. E porquê? Porque a Floresta era um sítio pequeno, os animais sabiam de todo e qualquer assalto e assaltozinho que acontecia e, para além de não estarem acostumados a esta realidade, desde que os jornais haviam descoberto que essas notícias vendiam como mel, faziam manchetes histéricas sempre que podiam.
Ora bem, era ano de eleições e um dos leões lá da selva, que queria a toda a força ser o Rei, mal soube disso viu logo uma oportunidade para falar mal do actual Rei e ganhar uns pontos junto do reino animal. Lá foi ele para a televisão e para os jornais, agarrado aos cabelos e aos gritos, dizer: “A culpa disso tudo é do actual Rei da Selva! E o assassinato do Kennedy e o acidente de Chernobyl também foi ele. Tudo culpa dele, é o que vos digo!!”
O presidente dos esquilos, que simpatizava com aquele leão, aproveitou logo para fazer uma reunião com os esquilos todos para debaterem a questão da insegurança na Comunidade dos Esquilos. O presidente das raposas fez o mesmo, e o presidente dos javalis, e dos veados… Enfim, todos aqueles que não gostavam muito do actual Rei da Selva fizeram as suas reuniões e, claro, com o máximo alarido que conseguiram.
Para o fim até haviam lá pelo meio uns grupos dispersos de andorinhas e uns chimpanzés que ameaçavam fundar milícias, assim numa cena à favela...
O Rei da Selva, vendo isso tudo e não querendo ficar para atrás nem querendo passar a impressão que não fazia nada em relação ao problema, teve de fazer também o seu papel. Manifestou a sua preocupação, fez lá o seu pé-de-vento, e até chamou o Chefe dos Tigres para lhe pedir justificações, já que eram os tigres os responsáveis pela segurança da Floresta.
Apareceram os jornais para lhes tirarem a fotografia da praxe e, mal os jornalistas saíram, o coitado do Chefe dos Tigres lá abriu a boca e disse: “Oh senhor, mas a gente prende os bandidos e tudo, só que eles nem chegam a aquecer os calabouços por causa das leis que os Leões vão inventando para o país sem nunca saírem das suas vivendas lá em Cascais. A gente até tem medo de apanhar os bandidos, não vão eles ficar com uma nódoa negra por causa das algemas e nós é que acabamos na cadeia ou a pagar-lhe indemnizações para o resto da vida por danos psicológicos e tretas assim”. O Rei da Selva encolheu os ombros e respondeu: “Eu sei, mas tenho que mostrar que estou a fazer alguma coisa, né?…”
O pior era que o aproveitamento político que se estava a fazer do recente fenómeno da criminalidade ofereceu um novo grau de alarmismo à situação. Enquanto todos os inimigos do Rei da Selva tentavam ganhar uns pontos às custas disso, fazia-se um espectáculo tão grande à volta da criminalidade que agora, mais do que antes, os animais vivem numa floresta com uma criminalidade de uma floresta do seu tamanho e em crescimento, mas amassados por um sentimento de insegurança como se vivessem na Amazónia!
Moral da história: Por muito má que seja uma situação, podemos sempre contar com os políticos para a piorarem…